É amanhã que vais viver?

É forçoso, desgraçado, que tu morras desconhecido.
em terras jamais profanadas por um leão
não faltarão, todavia, cães atiçados
pela deusa nua ou Afrodite saída das águas
ó Actéon feito veado e de seguida abocanhado
podes ladrar sem folgas contra mim numa língua emprestada
sem parança empecilhar-me o caminho com obstáculos e torturas
mas, chegue a que horas chegar, a noite virá.
questiono-te sem bolor na língua: “é amanhã que vais viver?”
conservo as minhas unhas afastadas de tais cantos
evito passar a perna a coxos e pernetas
cada verso o pesadelo dos deuses: uma gigantomaquia
ou é fogo ou é eco, hipérbole que vê no peixe o cardume
não me serve, prefiro uma avalanche de âmbar
capaz de aprisionar o Olimpo sem alarde
fazer dos deuses a minha colecção de insectos.
com que arte irás tu, desgraçado, esquivar-te da
lepra do esquecimento?
tal como abafaram os vagidos do pequeno Zeus
os curetes abafarão o verso feito rugido
dançando em volta dele e batendo com as armas
matarei o tempo carnívoro quando chegar a hora.
…
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