Vamos supor

Sou de carne e movediço
um verbo escoante
que se afeiçoou prematuramente
à queda.
Nos apeadeiros da queda fui deixando as peles e asas
de anjo de demónio e hoje sou, como um Cézanne tardio
uma mescla — queria dizer vibrante mas careço de coragem — de luz e sombras e cores
Indiferente à atração ou à repulsão
sou eu
o homem contemporâneo
herdeiro dos ecos mais obsoletos
sucedâneo do ontem
que em vão luta contra o calor
o inferno de uma palavra turbilhonando na língua.
Amor.
Vamos supor que a palavra é benigna
como nenhuma palavra o soube ser até hoje
Vamos supor que o fim é adiável
Vamos supor que isto não são suposições
para simplificar um problema matemático
que nunca nos faltarão olhos e mãos robustos para compreender
o problema na totalidade.
Vamos supor que a solução está, vívida, ao nosso alcance.
Vamos supor.