Quis o acaso
quis o acaso
após uma eternidade a inventariar
os deuses esborralhados
que nos encontrássemos aqui
neste interstício entre o prato e a fome
sim, não desminto
apóstolo que sou do declive áspero
ouso a língua onde os demais
estacam, regurgitam súplicas
abençoam ecos, remodelam fachadas
de paraísos artificiais.
de boca em boca experimentamos itinerários
corroído fui pelo ácido das sílabas silenciadas
propulsionado ainda pelo amor em ruínas
— cantilena grave que preludia catástrofes.
experimentei, uma a uma, reiteradamente
as coreografias da salvação
fui ao inferno pelo meu próprio pé
burilei-me na queda
até o caminho se tornar num exercício inócuo.
quis o acaso
ofertar-me, talvez, um milagre fora de época.