Das formas carcomidas leva-me a ironia a falar

roberto gamito
2 min readNov 13, 2021

Das formas carcomidas leva-me a ironia a falar
ó deuses não empatem a minha empresa
ó musas desamparem-me a loja
hoje dou folga às rosas e às aves

mudemos então de mão
busquemos a seta na aljava abandonada
e num vaivém de calores
oscilemos entre a prosa e a poesia
ó admirável mundo e vida vendida como nova!

Acepipe entre as pipas e pepitas
farsa salteada de sorrisos amarelos
a publicidade mobilando o cenário
de novela a que chamamos realidade.
Metáfora? Claro, é o prato do dia.

Nabos engalanados de artistas
gigantes postiços sem ninguém lá dentro
de mim até à minha altura póstuma
o turbilhão de círculos de legitimação
mar jamais vindimado e uma jangada
humilde, feita de penas de águia

fama efémera, holofote crematório
a cárie adentrando na alma, a mentira doce
a morte na sua coreografia de leopardo
convida-nos para uma última dança,
preferia não o fazer, ripostamos,
isso não é resposta, diz-nos, e a luz apaga-se.

Rotina, cálculo em cima de um joelho empoeirado
cacos de vasilhames ontem com vísceras faraónicas
serpente serpenteando aos esses nas províncias da redundância
fardos postos em música, burros à míngua.

Consultada a bibliografia das suas pernas
abordei-a de chofre
sem prefaciar o coração
uma Beatriz outrora só legendas
desceu do pedestal e ingressou no diálogo.
Fiz-lhe uma proposta audaz.

E que tal trocarmos o platónico por plutónico? Está na altura de trocarmos o circo das tangentes por um banquete pantagruélico que nos fizesse explodir de molde a resgatar as partes perdidas de Satíricon de Petrónio. Não sei se arranjo tempo para o amor, retrucou Beatriz, deixa-me consultar a minha agenda. Pronto, entrámos no país das hesitações, declarei amuado. Nos meus braços serias eterna e jamais precisarias de agendas. Não sei se alinho nessa brincadeira da eternidade, finalizou Beatriz, enquanto orlava o vulcão com passinhos de personagem literária. Nada feito, sobra-me o poema.

Tempestade de areia
olhos raiados de sangue
razia na visão, cárcere ambulante
alcancei-te de mãos vazias
sem bússola e sem norte
e foi a magna perdição.


Sigam-me: twitter |Instagram | Facebook | Túnel de Vento (Podcast)

Sign up to discover human stories that deepen your understanding of the world.

Free

Distraction-free reading. No ads.

Organize your knowledge with lists and highlights.

Tell your story. Find your audience.

Membership

Read member-only stories

Support writers you read most

Earn money for your writing

Listen to audio narrations

Read offline with the Medium app

roberto gamito
roberto gamito

Written by roberto gamito

A tensão da narrativa aumentou…e o narrador morreu electrocutado. @robertogamito

No responses yet

Write a response