A sede articula o mundo

Como se um intérprete obtuso tomasse o deserto pelo oceano,
pegasse nos cornos do nada e obrigasse a primeva besta a florir
não há lugar para o futuro nem para o presente incendiário.
Caídos da árvore do conhecimento
crente e luz regateiam
os trabalhos e os dias.
O fogo é um assunto do fogo.
As coisas como são
sê-lo-ão em breve.
Aguardem pelas cinzas.
Um mar que já não é inteiramente silábico, dotado de cheiro e fome, cantarolando o refrão da despedida.
Ao rés do asteróide cadente
a escrita torna-se profética ou teatral.
*
A sede articula o mundo
meio gesto teu, meio refrão
eu e os meus passos
somos um só
encho o salão de festas
com a solidão
tão vasta como o nome da amada
houvesse outro sol e seria Ícaro.
É o tom que falsifica. Aqui estou, meu adversário
o homem permanece vivo nas entrelinhas.
É como ter razão ao rés do furacão.
A noite inundada de nós.
Não há nomes em lugar nenhum.
Dias onde a memória esconderá pólvora
ao exceder a música
há-de pousar na mão um novo cérebro
hoje carne e osso
amanhã palavra esburacada.
Só ilusão e pressão
ó cachalote feito diamante
ó bicho que há séculos permaneces em apneia!
O meu pensamento não está vivo? Fui aniquilado?
Mas são estas perguntas distintas?
Cabeça nas nuvens, pés na lama,
sou o tigre à solta na minha língua
disto farei originar o fogo
sou as sobras que o cansaço não espezinhou.
A intensidade tornar-se-á burocrática?
Quero dizer tanto
o que é o amor
que só gaguejo.
…
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